...
— Temos que sair daqui. Agora. — A voz firme do meu pai cortou o silêncio tenso que pairava sobre nós.
Não houve discussão. Todos se apressaram para reunir o que fosse necessário. Malas foram arrastadas, mochilas jogadas às pressas sobre os ombros.
Foi quando, ao percorrer o corredor, vi minha gatinha de estimação. Meu coração gelou. Ela morava com minha mãe, então como poderia estar na casa do meu pai?
— O que você está fazendo aqui, hum? — Murmurei, agachando-me para fazer carinho nela.
Mas, para minha surpresa, ela recuou. Normalmente, era dengosa, do tipo que pulava no colo das pessoas apenas para receber atenção. Agora, porém, parecia desconfiada. Até arisca. Um desconforto percorreu minha espinha, mas sacudi a cabeça, tentando afastar o pensamento, e segui para a sala.
O medo me guiava, mas quando estávamos prontos para sair, minha avó, que até então permanecia deitada em seu quarto, recusou-se a nos acompanhar.
— Isso é besteira! Nada vai acontecer. — Disse, sentando-se no sofá com expressão serena, alheia ao caos.
— Vó, você não entende... Eu vi. Aquilo que pulou da janela... não era normal. — Murmurei, ajoelhando-me ao lado dela, tentando fazê-la enxergar o perigo.
— Já vivi o bastante pra saber que pânico não leva a nada. Eu fico. — Sua voz era calma, mas intransigente.
Tentei argumentar, mas senti uma mão em meu ombro. Quando me virei, entendi que não havia mais tempo. Suspirei, derrotada.
— Se cuida.
Ela apenas sorriu. A imagem dela ali, tão serena em meio ao desconhecido, grudou na minha mente enquanto eu seguia para a porta com os outros.
Assim que a abri, algo inesperado aconteceu.
Um cachorro disparou pelo corredor, saindo de um apartamento próximo. Seu focinho estava sujo, e atrás dele, a porta entreaberta exibia uma mancha escura se espalhando pelo chão. Sangue.
O animal latia freneticamente, assustado. Sem pensar, puxamos a porta de volta e trancamos. Ficamos ali, esperando o cão se acalmar, cada um contendo a própria respiração. Só quando o silêncio voltou ousamos sair. Um por um, atravessamos o corredor e entramos no elevador.
Mas, ao chegar à garagem, uma lembrança nos atingiu como um soco.
— As malas... — alguém murmurou.
O peso da decisão pairou sobre nós. Ninguém queria se oferecer.
— Eu subo e pego. — Disse, sem hesitar.
Antes que a porta do elevador se fechasse, senti um movimento ao meu lado. Minha irmã entrou apressada, porém era minha irmã mais nova, a qual não estava conosco antes.. como ela veio parar aqui?
— Você não vai sozinha.
Não havia tempo para discutir. Assim que chegamos ao nosso andar, pegamos as malas o mais rápido possível. Mas então, um som.
Alto. Seco.
Como algo pesado caindo próximo de nós.
Meus músculos travaram. Meus olhos buscaram os da minha irmã. Não precisávamos dizer nada. Puxei seu braço, e corremos para dentro do elevador. Apertei o botão repetidamente até as portas finalmente se fecharem.
Minha cabeça turbilhava de perguntas sem respostas. A presença inesperada da minha irmã. O caos se espalhando pela cidade. Mas não havia tempo para pensar nisso agora.
Eu só precisava sobreviver.
Ao descer, encontramos os outros dentro de um salão na garagem. Algumas pessoas já estavam ali, refugiadas.
— Por que aqui? — Perguntei, ainda ofegante.
— Vamos esperar as coisas acalmarem antes de sair.
Assenti, embora não acreditasse que aquilo simplesmente "se acalmaria".
O salão era amplo, com algumas cadeiras espalhadas e uma janela que dava vista para casas e ruas desertas. A garagem era alta, construída em rampa, e por um instante, o mundo lá fora pareceu ainda mais distante.
Decidi explorar o espaço, tentando encontrar qualquer detalhe que me ajudasse a entender o que estava acontecendo. Me aproximei de uma das janelas afastadas, sentindo o peito apertar.
Meu coração batia descompassado.
Tentei me concentrar nas vozes ao meu redor, no murmúrio das conversas sobre o que estava acontecendo lá fora. Mas nada adiantava. O pânico crescia dentro de mim como uma presença física, esmagando meu peito.
— Bella?
Olhei para trás e vi uma de minhas irmãs mais velhas.
— Vai ficar tudo bem. Eu tenho certeza que é só questão de tempo até tudo voltar ao normal.
Ela passou a mão delicadamente pelo meu ombro, tentando me confortar.
— Eu espero... — Suspirei, sem conseguir acreditar em suas palavras.
Nada fazia sentido. O que poderia estar causando tudo isso? Alienígenas? Entidades? Demônios? Armas biológicas? Um vírus?
— Além de tudo isso, tem algo me incomodando... — Comentei, forçando um sorriso, tentando amenizar minha própria confusão. — A nossa gatinha de estimação apareceu do nada na casa do papai. E nossa irmã mais nova também.
Minha irmã franziu a testa.
— Como assim? Onde você as viu?
— A gatinha estava lá no apartamento... e nossa irmã desceu comigo.
Ela arregalou os olhos.
— No apartamento? E desceu com você?
Assenti.
— Mas... — Ela hesitou. — Você desceu sozinha. E eu não vi nenhuma gatinha no apartamento.
O silêncio caiu sobre nós.
Antes que eu pudesse reagir, um barulho forte ecoou pelo salão.
Forte. Perto.
Alguém gritou. Pessoas correram até a porta, empurrando cadeiras, mesas, qualquer coisa grande o suficiente para barrar a entrada. Outros se juntaram às janelas, procurando uma rota de fuga.
Minhas mãos tremiam. Meu corpo formigava. O suor escorria pela minha nuca.
Pensamentos.
Confusão.
Medo.
O que está acontecendo com o mundo?
...
Então, vi o vidro quebrado no chão.
Meu olhar fixou-se nele. Meu pensamento tornou-se um só.
Se acabar com isso agora, o medo acaba também.
Minha respiração desacelerou. O mundo ao meu redor sumiu.
Eu só precisava de um movimento. Apenas um.
Mas seria o certo?
...
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