O local era dividido em bar e pista de dança, no primeiro tinham várias mesas e um balcão "infinito", com muitas pessoas sentadas e muitos copos de cerveja. Ao transpassar o umbral várias pessoas notaram e trocaram olhares. Os que estavam em companhia comentaram coisas que não consegui discernir. Numa hora dessas era muito bom ter audição apurada, ou não... Os sentimentos que me assaltaram eram de animosidade, de ciúmes, de paixão, de pena, mesclados ao cheiro forte da cerveja. Finalmente consegui vislumbrar uma cadeira livre no balcão e rumei para ela, sendo abordada por um "barman" assim que sentei: "O que vai querer?", "Uma cerveja, por favor" - respondi para não destoar da maioria e, mesmo que não a bebesse, ia aproveitar pra segurar o copo friozinho nas mãos.
De onde estava via a parte das mesas, a pista de dança e a banda que tocava animadamente. Minhas pernas já estavam no ritmo sem que eu percebesse e só notei isso quando vi James entrar e acenar com a cabeça e a boca do tipo "não acredito, olha pra você!" e ao me analisar parei de balançar o pé. Ele entrou e começou a caminhar entre as mesas, sentindo sutilmente os cheiros e checando o rosto das pessoas. De vez em quando olhava para a pista de dança e batia uma das mãos na coxa, no ritmo da música. Eu ria baixinho e aí ele olhava pra mim, com ar de riso e reprovação, numa das vezes ele tentou fazer sinal com a outra mão para que eu parasse de olhar pra ele, ao que eu arregalei os olhos, dando a entender que a "ficha tinha caído" e me virei no balcão, dando um levíssimo gole na cerveja. Fiz uma careta velada e pensei em como aquilo era ruim!!
Depois de percorrer todo o salão, cerca de uma hora e meia, indo até mesmo na toalete, James pediu para Rosie me informar que eu já podia encontrá-lo lá fora. Nenhum dos cheiros estava perto de lembrar nosso alvo.
Saí em seguida ao anúncio, ele estava do outro lado da rua me esperando:
"A gente pensa que conhece as pessoas, né, dona Liura. 'cê nasceu pra esse mundo country. 'cê tem ritmo e presença." - comentava entre uma risada e outra, até curvando o dorso.
"Eu sou uma pessoa eclética mesmo... Confesso que não seria tão difícil de me encaixar, mas acontece que não tem isso no Brasil, graças a Alá!"
"Vem, vamos pro próximo. 'cê vai sentir saudades disso tudo no teu país... Tenta não dar tanto na cara que estamos juntos no próximo bar, ok? Dessa vez eu entro primeiro."
"Mas você não acha que numa cidade tão pequena dessas as pessoas não conectem o fato de dois estrangeiros entrarem, mesmo que com alguma distância de tempo, num bar?"
"É que eu não sou estrangeiro. Conheço todos os funcionários do próximo bar que vamos entrar. Eu trouxe muito turista aqui quando era guia... Além do mais, muitos 'tão bêbados demais pra fazerem conexões!"
"Sempre contava a mesma história pra elas?" - deixando transparecer uma ponta de ciúmes.
"Ei! Que ciumenta... Eu não ando por aí mostrando as garras pra qualquer uma não, senhorita... Aliás, fazia tempo que não expunha pra alguém fora da escola." - rindo da situação e depois ficando introspectivo.
Beijou minha mão direita e saiu em disparada para o próximo bar. Quando entrei ele ainda cumprimentava os "barmans" e algumas garçonetes, tenho quase certeza de que deixou essas pro final só pra se mostrar... Elas estavam bem animadas com a presença dele. O que será que ele tinha, hein? Era aquele odor de almíscar? Ou o sorriso aberto e genuíno? Podia ser também o físico de alguém que curte malhar, mas sem os exageros dos gibis... Vai saber!
Sentei-me novamente no balcão, pedi por outra cerva e fiz o mesmo panorâmico que no outro bar, dessa vez evitando olhar muito para James e focando na dança, o ritmo da música era o mesmo e a disposição dos móveis também. Quando me dei por mim estava, novamente, batendo a mão na coxa no ritmo da música! "Maldição", soltei em português e o homem que estava do meu lado esticou o pescoço para olhar no meu rosto, em inglês ele perguntou se eu não era canadense; começamos a conversar e eu fui elogiada pelo meu inglês, pela minha roupa e, por fim, pelos meus olhos -que, sinceramente, não têm nada de especial... São castanho claro, com poucos cílios e eu os considero pequenos para meu rosto- comentando que tinha notado minha chegada e seu eu poderia ceder a próxima dança a ele, procurei por James desesperadamente e não encontrei; agradeci, mas tinha que recusar por não saber dançar, já que não havia esse tipo de entretenimento no meu país. Ele aceitou a recusa, saindo em seguida do meu lado e, em poucos minutos, o aviso de Rosie voltou a soar em minha mente. Já podia sair pois nesse também James não havia encontrado nenhuma pista.
Dessa vez ele me esperava na mesma calçada, se distanciando ainda mais da moto, rumo a outro bar que ficava a 10 metros daquele.
"A senhorita poderia me ceder o prazer da próxima dança?" - imitando o cara que tinha me convidado e sorrindo.
"Sem graça!... Se continuar assim até o fim da noite eu vou saber dançar e aí eu quero ver! Os ritmos são parecidos e os passos mudam muito pouco, eu vou decorar!" - fazendo sinal de "me aguarde" com uma das mãos. Ele parou de sorrir e completou que essa dança já tinha dono, e era ele!
"Então vê se para de imitar os outros e me convida direito, homem! Que essa noite não termina enquanto eu não dançar country! E que ninguém do Brasil me ouça!" - aí quem riu fui eu, pensando nas minhas amigas que jamais imaginariam a mim dançando esse tipo de ritmo, ou qualquer outro tipo!
A porta do terceiro bar era estilo "saloon" e era possível antever uma construção mais sóbria que os outros dois. O ritmo também era outro, mais lento e as pessoas na pista de dança estavam abraçadas; a cerveja era escura em sua maioria e não havia parte com mesas, apenas um balcão, gigante com no primeiro bar. James já estava se enturmando. Dessa vez pediu uma cerva escura e estava com um copo nas mãos, conversando com o "barman" animadamente. Achei aquilo estranho, mas resolvi ignorar. Sentei cerca de quatro bancos de distância dele e pedi por um suco, estava desidratada! A cara do "barman" foi de descrédito total, ele me disse que não tinham suco e então eu disse que podia ser uma água. Ao que o descrédito aumentou! "Claro, um momento".
James me lançou um olhar questionador e eu disse, através da Rosie que estava desidratada e precisava beber algo! Rosie explicou telepaticamente que eu não bebia nada alcoólico e aí foi a vez de James levantar a sobrancelha, incrédulo! E ajuntou, "é lacto-vegetariana também." Os lábios dele fizeram movimento de "WTF?!" e eu sorri. Já estava acostumada com as pessoas achando quase tudo que eu fazia estranho, por que não ele?...
Novamente eu vi aquelas dobras de sorriso disfarçado nos olhos dele, como eram difíceis de identificar e como era recompensador vê-las! Elas autenticavam que ele sorria com a alma também. E foi nesse momento que os olhos dele mudaram de direção, sem mover a cabeça ele afinou os olhos e apurou o nariz, tinha encontrado algo! E isso era muito bom!
Fiquei séria, dando mostras de não querer atrapalhar as investigações dele e aproveitei a chegada do meu copo de água para tomar, aprumei o corpo em relação à bancada e ignorei a presença de James do meu lado, somente rezava para que eu pudesse, de alguma forma, ajudar, ser útil! Realmente, esse era um dos pedidos constantes que eu fazia. E agora pode ser que fosse capaz de realizar! Que fosse feita a vontade de D~us!
"Boa noite, jovem" - falou uma voz firme e simpática atrás de mim. "Primeira vez aqui, né?" - e, no mesmo instante, Rosie soltou: "é ela! cuidado!", ao me virar, lentamente, pra alterar meu rosto de espanto, percebi que algo não encaixava, era uma mulher!
Eles estavam certos, a criatura havia me encontrado e, pela quantidade de pessoas naquele salão isso só podia significar uma coisa: eu realmente tinha algo de diferente! Ou... Ela tinha altos escrúpulos em matar conhecidos...
"Boa noite! Primeira vez sim! Sou do Brasil e sempre tive curiosidade em conhecer as Rochosas e seus costumes." - criando coragem, estendi minha mão e soltei: "Chamo-me Liura, muito prazer!"
"Nossa, você está bem longe do seu país, veio acompanhada? Digo, tem alguém pra te mostrar as Rochosas e nossos "costumes"?" - o interesse dela só aumentava e isso até lançou uma chispa em seus olhos, com claras mostras de querer me mostrar muito mais do que tudo que eu tinha dito querer ver - "Meu nome é Audrey, a seu inteiro dispor" - e levantou as mãos, dando uma volta em si mesma.
Ela era muito bonita, loira, não devia ter mais de 18 anos e aquela voz firme parecia não fazer parte dela, juntamente com algo na simpatia dela que parecia forjada, não conseguia captar o que era... Ao ouvir aquilo, aquele oferecimento, quase engasguei com a água! Foi preciso a voz de Rosie, junto com a de James para me acalmarem "'cê consegue fazer o jogo dela? Senão cai fora que daqui cuido eu!"
"Her... Eu agradeço a oferta, Audrey... Eu... Eu nunca fiz isso antes..." - a minha voz passou de incerta para curiosa, eu me levantei e ela, que devia ter 1,60m, me olhou com cobiça da cabeça aos pés, enquanto falava:
"Querida, pra tudo tem uma primeira vez... Claro, se você estiver a fim, eu super estou! Tem algo no seu olhar que me traz uma paz..." - ela disse de modo bem animado e a última frase foi falada mais baixo, quase rouca de desejo.
"Gente, eu vou nessa! Quero tirar ela daqui pra que James possa fazer o que faz melhor: salvar minha vida!" - foram minhas últimas palavras para James e Rosie enquanto estendia a mão para pegar a da Audrey que estremeceu ao me tocar e, preciso confessar, eu também senti algo instintivo aflorando, foi estranho...
"Se incomoda em irmos conhecer a floresta primeiro? Tem um lugar que eu quero te mostrar, a Lua fica incrível de lá, você precisa ver! Sabe, é daquelas coisas que a gente tem que ver antes de morrer..." - e novamente eu vi uma chispa estranha em seu olhar...
"Claro, Audrey" - falei mecanicamente - "Ver as Rochosas e depois morrer..." como a famosa frase do século XIX, só que em relação a Paris.
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